Elas apareceram como o instrumento necessário e aceitável para lidar com manifestações urbanas dentro do Estado liberal democrático. Mas, representam também, o aperfeiçoamento do aparato repressor do Estado que começou a importar armas de guerra para seus centros urbanos. 

As armas de baixa letalidade são equipamentos utilizados pelas forças de segurança do Estado a fim de dispersar multidões, conter possíveis danos ao patrimônio público e privado, e imobilizar aqueles reconhecidos como ‘infratores’ por meio da dor e do medo.

Esses armamentos são utilizados em operações policiais cotidianas de perseguição a suspeitos e revista, por exemplo, e até existem relatos de tortura envolvendo o uso dessas armas. Podemos lembrar do caso do estudante brasileiro morto na Austrália, em março de 2012, por eletrochoques de teaser disparados pela polícia local. E de dezenas de relatos de que os oficiais usam spray de pimenta no camburão ao levar presos para delegacias.

As manifestações, no entanto, são os principais cenários aonde as forças estatais utilizam as armas de baixa letalidade. No Brasil, as mais utilizadas são as bombas de gás lacrimogêneo, granada de efeito moral, spray de pimenta, tonfa (ou cassetete), pistola teaser, e munições de impacto controlado (balas de borracha).

Da onde surgiram essas armas?

As armas de baixa letalidade têm cada qual a sua própria história: algumas se remetem aos tempos da Primeira Guerra Mundial e outras aos dias atuais. Apesar disso, a ideia de criar um conjunto de armas com menos letalidade que as munições comuns surgiu na década de 1960 quando diversos protestos urbanos irrompiam ao redor do mundo. Foi apenas nessa época que um grupo de armamentos variados começou a ser descrito como “armas não letais”.

Frente às mobilizações populares e estudantis, o governo norte-americano requisitou novos tipos de armamentos que fossem capazes de dispersar a população, mas que, ao mesmo tempo, não ferissem tanto quanto os armamentos comuns. As armas de baixa letalidade apareceram como o instrumento necessário e aceitável para lidar com manifestações urbanas dentro do Estado liberal democrático. Mas, representam também, o aperfeiçoamento do aparato repressor do Estado que começou a importar armas de guerra para seus centros urbanos.

Durante os protestos de 1968 e 1969, os oficiais norte-americanos começaram a utilizar o gás lacrimogêneo, que jogavam no Vietnã, contra seus próprios cidadãos, deixando quatro manifestantes mortos.

Na época, a tecnologia mais avançada nesta categoria eram as armas que continham agentes químicos, como o spray de pimenta e o gás lacrimogêneo. Estes instrumentos faziam parte do programa de armas químicas desde a Primeira Guerra Mundial e foram adotados pelos departamentos de polícia para realizar o controle de distúrbios, tumultos e manifestações.

Durante os protestos de 1968 e 1969, os oficiais norte-americanos começaram a utilizar o gás lacrimogêneo, que jogavam no Vietnã, contra seus próprios cidadãos. Em maio de 1969, durante os protestos de Berkeley, na Califórnia, a guarda norte-americana jogou de helicópteros enormes quantidades de gás lacrimogêneo nos manifestantes. Em manifestações contra a guerra do Vietnã, o gás também foi amplamente utilizado. Na universidade de Estado de Kentucky, quatro estudantes foram mortos pela exposição ao gás lacrimogêneo.

Entre os anos de 1971 a 1987, não houve grandes avanços tecnológicos nas armas de baixa letalidade, mas as indústrias responsáveis por sua produção expandiram. Até a década de 1990, as armas menos letais já haviam sido implantadas ao redor do mundo, majoritariamente pelos Estados Unidos e Europa.

Por que “menos letais”?

As armas de baixa letalidade ficaram conhecidas, popularmente, pelo nome de “armas não letais” como se não pudessem ferir ou matar suas vítimas. Muitas vezes, agentes do Estado reforçam essa denominação, justificando que a repressão estatal não pode causar danos físicos. Isso fica claro quando pensamos na chamada “bomba de efeito moral”: apesar de seu nome indicar que o efeito é moral, esse explosivo é de estilhaço e pode ferir gravemente, levando até a morte.

Por esta razão, a denominação mais correta para esse conjunto bélico é “baixa letalidade” ou “menos letalidade” em sua comparação ao arsenal extremamente letal.